segunda-feira, 11 de novembro de 2013

VAMOS ESTUDAR O PRÉ-MODERNISMO? - 4º BIMESTRE

4º bimestre da 2ª série- CECIERJ
 CRÔNICA E ROMANCE NO PRÉ-MODERNISMO / SEMINÁRIO E DEBATE REGRADO

TEXTO GERADOR 1
O romance no Pré-Modernismo pode ser refletido por meio de um dos maiores escritores do período: Lima Barreto, jornalista, cronista, contista e romancista. Sua forma de escrever era simples e comunicativa, expondo o retrato da sociedade carioca. Um exemplo disso é a obra “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, publicado em folhetim em 1911 e em livro em 1915. “A Lição de Violão” é o primeiro capítulo da narrativa e apresenta o idealismo patriótico de seu protagonista.

A Lição de Violão

                Como de hábito, Policarpo Quaresma, mais conhecido por Major Quaresma, bateu em casa às quatro e quinze da tarde. Havia mais de vinte anos que isso acontecia. Saindo do Arsenal de Guerra, onde era subsecretário, bongava pelas confeitarias algumas frutas, comprava um queijo, às vezes, e sempre o pão da padaria francesa.
                Não gastava nesses passos nem mesmo uma hora, de forma que, às três e quarenta, por aí assim, tomava o bonde, sem erro de um minuto, ia pisar a soleira da porta de sua casa, numa rua afastada de São Januário, bem exatamente às quatro e quinze, como se fosse a aparição de um astro, um eclipse, enfim um fenômeno matematicamente determinado, previsto e predito.
                A vizinhança já lhe conhecia os hábitos e tanto que, na casa do Capitão Cláudio, onde era costume jantar-se aí pelas quatro e meia, logo que o viam passar, a dona gritava à criada: “Alice, olha que são horas; o Major Quaresma já passou.” E era assim todos os dias, há quase trinta anos. Vivendo em casa própria e tendo outros rendimentos além do seu ordenado, o Major Quaresma podia levar um trem de vida superior aos seus recursos burocráticos, gozando, por parte da vizinhança, da consideração e respeito de homem abastado.
                Não recebia ninguém, vivia num isolamento monacal, embora fosse cortês com os vizinhos que o julgavam esquisito e misantropo. Se não tinha amigos na redondeza, não tinha inimigos, e a única desafeição que merecera fora a do Doutor Segadas, um clínico afamado no lugar, que não podia admitir que Quaresma tivesse livros: “Se não era formado, para quê? Pedantismo!”
                O subsecretário não mostrava os livros a ninguém, mas acontecia que, quando se abriam as janelas da sala de sua livraria, da rua poder-se-iam ver as estantes pejadas de cima a baixo. Eram esses os seus hábitos; ultimamente, porém, mudara um pouco; e isso provocava comentários no bairro. Além do compadre e da filha, as únicas pessoas que o visitavam até então, nos últimos dias, era visto entrar em sua casa, três vezes por semana e em dias certos, um senhor baixo, magro, pálido, com um violão agasalhado numa bolsa de camurça. Logo pela primeira vez o caso intrigou a vizinhança. Um violão em casa tão respeitável! Que seria?(...) Quaresma era um homem pequeno, magro, que usava pince-nez, olhava sempre baixo, mas, quando fixava alguém ou alguma cousa, os seus olhos tomavam, por detrás das lentes, um forte brilho de penetração, e era como se ele quisesse ir à alma da pessoa ou da cousa que fixava.
                Contudo, sempre os trazia baixos, como se se guiasse pela ponta do cavanhaque que lhe enfeitava o queixo. Vestia-se sempre de fraque, preto, azul, ou de cinza, de pano listrado, mas sempre de fraque, e era raro que não se cobrisse com uma cartola de abas curtas e muito alta, feita segundo um figurino antigo de que ele sabia com precisão a época.
Quando entrou em casa, naquele dia, foi a irmã quem lhe abriu a porta, perguntando:
- Janta já?
- Ainda não. Espere um pouco o Ricardo que vem jantar hoje conosco.
- Policarpo, você precisa tomar juízo. Um homem de idade, com posição, respeitável, como você é, andar metido com esse seresteiro, um quase capadócio - não é bonito!
                Na ficção, havia unicamente autores nacionais ou tidos como tais: o Bento Teixeira, da Prosopopéia; o Gregório de Matos, o Basílio da Gama, o Santa Rita Durão, o José de Alencar (todo), o Macedo, o Gonçalves Dias (todo), além de muitos outros. Podia-se afiançar que nem um dos autores nacionais ou nacionalizados de oitenta pra lá faltava nas estantes do major.
(...)
                Policarpo era patriota. Desde moço, aí pelos vinte anos, o amor da pátria tomou-o todo inteiro. Não fora o amor comum, palrador e vazio; fora um sentimento sério, grave e absorvente. Nada de ambições políticas ou administrativas; o que Quaresma pensou, ou melhor: o que o patriotismo o fez pensar foi num conhecimento inteiro do Brasil, levando-o a meditações sobre os seus recursos, para depois então apontar os remédios, as medidas progressivas, com pleno conhecimento de causa.
                Logo aos dezoito anos quis fazer-se militar; mas a junta de saúde julgou-o incapaz. Desgostou-se, sofreu, mas não maldisse a Pátria. O ministério era liberal, ele se fez conservador e continuou mais do que nunca a amar a “terra que o viu nascer”. Impossibilitado de evoluir-se sob os dourados do Exército, procurou a administração e dos seus ramos escolheu o militar. Era onde estava bem. No meio de soldados, de canhões, de veteranos, de papelada inçada de quilos de pólvora, de nomes de fuzis e termos técnicos de artilharia, aspirava diariamente aquele hálito de guerra, de bravura, de vitória, de triunfo, que é bem o hálito da Pátria. Durante os lazeres burocráticos, estudou, mas estudou a Pátria, nas suas riquezas naturais, na sua história, na sua geografia, na sua literatura e na sua política. Quaresma sabia as espécies de minerais, vegetais e animais, que o Brasil continha; sabia o valor do ouro, dos diamantes exportados por Minas, as guerras holandesas, as batalhas do Paraguai, as nascentes e o curso de todos os rios. Defendia com azedume e paixão a proeminência do Amazonas sobre todos os demais rios do mundo. Para isso ia até ao crime de amputar alguns quilômetros ao Nilo e era com este rival do “seu” rio que ele mais implicava. Ai de quem o citasse na sua frente! Em geral, calmo e delicado, o major ficava agitado e malcriado, quando se discutia a extensão do Amazonas em face da do Nilo.
(Lima Barreto)
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VERBETE:
Bongava- procurava, buscava
Monacal- próprio de monge
Misantropo- que tem aversão a pessoas, que não gosta de conviver com outras pessoas
Pedantismo- ato de ostentar cultura e erudição
Pejadas- cheias, repletas
Pince-nez- Óculos leves que se mantêm no nariz pela pressão de uma mola
Capadócio- que é pouco inteligente; que é impostor, trapaceiro
Palrador- falador, tagarela
Inçada- coberta
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ATIVIDADE DE LEITURA
QUESTÃO 1

O estilo de Lima Barreto, fluente, descontraído, distante dos padrões de linguagem do final do século XIX, é um ponto de contato com muitos autores que conquistaram fama após a Semana de Arte Moderna, em 1922. Uma importante característica de “Triste Fim de Policarpo Quaresma” é a linguagem descontraída que integra frases espontâneas e naturais, comuns à linguagem oral. Em diferentes passagens da obra em estudo, podemos perceber o tom prosaico, de conversa, com que o narrador relata o cotidiano de Policarpo Quaresma. A opção em que esse traço fica evidente é:
a) “Não recebia ninguém, vivia num isolamento monacal, embora fosse cortês com os vizinhos que o julgavam esquisito e misantropo”.
b) “Logo aos dezoito anos quis fazer-se militar; mas a junta de saúde julgou-o incapaz. Desgostou-se, sofreu, mas não maldisse a Pátria”.
c) “Defendia com azedume e paixão a proeminência do Amazonas sobre todos os demais rios do mundo.”
d) “Para isso ia até ao crime de amputar alguns quilômetros ao Nilo e era com este” rival do
“seu” rio que ele mais implicava. Ai de quem o citasse na sua frente!

Habilidade trabalhada: Relacionar os modos de organização da linguagem às escolhas do autor, à tradição literária e ao contexto

Resposta comentada
Para iniciar a discussão sobre a questão, convém destacar que o Pré-modernismo não se configura como uma escola literária com características bem definidas, conforme os alunos têm se habituado a conhecer, ou seja, não é um período em que há diferentes autores afinados em torno de um ideal estético. É importante esclarecer que o Pré-modernismo é um termo que busca aglutinar a produção literária de certos autores que, ainda não sendo tidos como modernos, já demonstravam rupturas com o passado e pontos de contato com a estética que estaria por vir, o Modernismo.
Essa introdução é necessária para que os alunos façam uma reflexão sobre os usos da linguagem em “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, foco dessa questão. O fato de Lima Barreto fazer uso de uma linguagem mais descontraída e menos academicista afasta-o de autores que cultivam a escrita pomposa, como parnasianos e simbolistas, por exemplo. Ao mesmo tempo em que o afasta de escolas anteriores ou até mesmo contemporâneas, aproxima-o de autores modernos que muito bem cultivaram a escrita simples, pouco pomposa e até mesmo informal.
Especificamente sobre as alternativas, é necessário que o aluno aponte aquela que possui um tom prosaico, de conversa informal. Por eliminação, pretende-se que o aluno perceba ser correta a alternativa d, que contém uma expressão tipicamente informal, própria da fala – Ai de quem – mas incomum na escrita, sobretudo na escrita literária. Daí a novidade, em termos de estilo, trazida por Lima Barreto. Para eliminar as opções a, b e c basta salientar que todas apresentam frases que, embora possam aparecer na fala cotidiana, não destoam da linguagem escrita formal: sem gíria, sem entonação comum à fala, diferente da opção d, em que até mesmo a postura exclamativa a aproxima do tom de conversa informal.

ATIVIDADE DE LEITURA

QUESTÃO 2
Leia atentamente o trecho abaixo e, na sequência, leia o fragmento de “Triste Fim de Policarpo Quaresma” destacado em itálico:

O primeiro instrumento de cordas que se tem notícias que chegou ao Brasil foi a viola de dez cordas ou cinco cordas duplas, muito popular entre os portugueses e precursora do violão, trazida pelos jesuítas portugueses que aqui chegaram para catequizar os índios e a usavam durante a catequese.
O violão, por ser um instrumento muito usado na música popular brasileira e pelo povo, passou a ter uma má fama, sendo considerado por muitos como um instrumento de boêmios, presente entre seresteiros, chorões, tornando-se um símbolo de vagabundagem e, carregando consigo este estigma por muitos anos.
Em virtude desta discriminação sofrida pelo violão no Brasil e sua associação, os primeiros que tentaram desmistificar esse ranço pejorativo e discriminatório do violão, divulgando-o como um instrumento sério foram considerados verdadeiros heróis.
“Quando entrou em casa, naquele dia, foi a irmã quem lhe abriu a porta, perguntando:
- Janta já?
- Ainda não. Espere um pouco o Ricardo que vem jantar hoje conosco.
- Policarpo, você precisa tomar juízo. Um homem de idade, com posição,
respeitável, como você é, andar metido com esse seresteiro, um quase capadócio – não é bonito!”
Em “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, Lima Barreto traz ao leitor elementos próprios das relações humanas, que, longe de particularizarem o Brasil da época, estão presentes em todas as sociedades, de qualquer época. Um tema universal abordado no fragmento destacado acima é:
a) o despreparo político
b) a corrupção na política
c) as relações de interesse
d) o preconceito social

Habilidade trabalhada: Reconhecer a abordagem de temas universais na produção literária do negro brasileiro
Resposta comentada

Como é provável que os alunos não tenham lido “Triste Fim de Policarpo Quaresma” em sua totalidade, não se darão conta de muitos dos temas que figuram na obra. Por essa razão, antes de comentar as alternativas, convém fazer um breve apanhado sobre o livro, salientando, se possível, diferentes temáticas importantes que Lima Barreto põe em cena, como o nacionalismo ufanista do personagem Policarpo, o exagerado militarismo da política brasileira da época, a burocracia etc.
Para esclarecer a questão da universalidade, é possível dar exemplos de questões particulares do nosso país à época de Lima Barreto, como a recém Proclamação da República, a Revolta de Canudos (tematizada na obra “Os sertões”, de Euclides da Cunha), a Revolta da Vacina, a Revolta da Chibata etc. Isso irá contribuir para a diferenciação necessária entre o que é uma questão universal (como, por exemplo, a fome, a corrupção etc.) e o que é uma questão particular de uma sociedade.
Depois dessa introdução e de o aluno ler atentamente o fragmento, será levado a perceber que, embora todos os temas que figuram nas alternativas possam ser considerados universais (não particulares do nosso país), três deles não se fazem presentes no fragmento apresentado na questão.
O único tema de caráter universal presente no trecho em análise é o preconceito social. Outro trecho que pode ser apontado para demarcar o preconceito social é:
“Além do compadre e da filha, as únicas pessoas que o visitavam até então, nos últimos dias, era visto entrar em sua casa, três vezes por semana e em dias certos, um senhor baixo, magro, pálido, com um violão agasalhado numa bolsa de camurça. Logo pela primeira vez o caso intrigou a vizinhança. Um violão em casa tão respeitável! Que seria?”No trecho selecionado para o enunciado e no transcrito acima, fica clara a forma preconceituosa com a qual tanto a vizinhança como a irmã de Policarpo encaravam o fato de o mesmo receber em sua casa um professor de violão. Este, considerado um “capadócio”, não era visto como uma boa companhia para um homem de “posição” como o Major Quaresma. Após declarar a alternativa d como correta, cabe uma breve discussão sobre diferentes formas pelas quais o preconceito pode se fazer presente nas diferentes sociedades: em função de raça, gênero, etnia, profissão, idade, classe social etc. Também é importante ressaltar que, ao contrário do que os alunos podem imaginar, diferentes formas de preconceito existem não somente em nosso país, configurando-se, infelizmente, em um problema universal a ser combatido.

ATIVIDADE DE USO DA LÍNGUA
QUESTÃO 3

Leia o trecho a seguir:

“De há muito que a nossa engenharia municipal se devia ter compenetrado do dever de evitar tais acidentes urbanos.”

O período acima destacado pode demandar certo esforço de compreensão por parte de alguns leitores, devido ao uso de expressões e/ou elementos não tão usuais nos textos escritos atualmente.
Uma maneira de diminuir esse esforço de compreensão por parte do leitor seria a substituição dessas expressões e/ou elementos por outros mais frequentes na linguagem formal contemporânea, o que torna o período mais claro e objetivo. Tendo em vista esse comentário, assinale a única alternativa em que a reescrita, em prol de maior clareza e objetividade, altera o conteúdo semântico original.

a) Faz muito tempo que a engenharia do nosso município deveria ter se apoderado do dever de evitar esses acidentes urbanos.
b) A engenharia do nosso município deveria, há muito tempo, ter se apoderado do dever de evitar tais acidentes urbanos.
c) Há muito tempo que a engenharia municipal deveria ter se apoderado do dever de evitar tais acidentes urbanos.
d) Se a engenharia do nosso município há muito tivesse se apoderado de seu dever, evitaria tais
acidentes urbanos.

Habilidade trabalhada: Empregar adequadamente a linguagem e os fatores de textualidade como clareza e objetividade.

Resposta comentada

Ao iniciar a correção dessa questão, você pode questionar aos alunos se o entendimento deles sobre o período em destaque demandou ou não certo esse esforço de compreensão. É possível que alguns considerem difícil a compreensão do período, porém outros podem não demonstrar dificuldade alguma. É possível, então, conversar com os alunos sobre as possíveis razões para que o entendimento do trecho demande maior esforço. Nesse diálogo, é importante ressaltar que, de fato, expressões como “De há muito” e “se devia ter compenetrado” não são usuais hoje em dia, mesmo na linguagem formal. Pode-se considerar, então, que o uso dessas expressões, assim como a ordem dos termos no período, reduz a clareza e a objetividade do trecho em questão.
É importante observar que a crônica de Lima Barreto, por ser um texto literário, não tem o compromisso de ser um texto absolutamente claro e objetivo, característica exigida dos textos científicos, de divulgação científica, de alguns gêneros jornalísticos (notícia, reportagem etc.). É necessário ressaltar, ainda, que o trecho em questão pode ter sido lido na época em que foi escrito sem ser considerado pouco claro, ou seja, que a construção poderia ser usual nos idos de 1915 (ano da escritura da crônica).
A questão propõe ao aluno que torne o referido trecho um período mais claro e objetivo para o leitor contemporâneo, sendo necessário, para tanto, manter o registro formal da língua portuguesa e o conteúdo semântico expresso no trecho. Após essa introdução, pode-se partir para a análise das alternativas, ratificando que o aluno deve assinalar a única opção que não substituiria adequadamente o período destacado.
A opção a troca as expressões “De há muito” por “Faz muito tempo”; “engenharia municipal” por “de nosso município” ; “se devia ter compenetrado” por “deveria ter se apoderado” e “tais acidentes” por “esses acidentes”. As construções foram alteradas, manteve-se o registro formal e também o sentido original.
A opção b coloca em evidência o sujeito “A engenharia do nosso município”; intercala o comentário do narrador - “há muito tempo”- (no lugar de “De há muito”) e troca “ter compenetrado” por “ter apoderado”. Aqui, a nova construção não fere a linguagem formal nem o conteúdo semântico original.
A opção c se limita a substituir duas expressões pouco usuais na linguagem formal contemporânea por duas mais atuais (De há muito”/“Faz muito tempo”; “se devia ter compenetrado”/“deveria ter se apoderado”), tornando mais clara a leitura e mantendo o sentido do trecho original.
A opção d é a única que, embora também escrita em uma linguagem formal e de leitura fácil e clara, deturpa o conteúdo semântico original do período. A alteração da semântica ocorre devido à inclusão de uma oração condicional (“Se a engenharia...”) que não se observa no período original.
Apesar de o narrador demonstrar insatisfação com o trabalho da engenharia municipal (no período original), não é possível depreender que os acidentes seriam evitados, caso a mesma houvesse se ocupado de sua tarefa. Na verdade, o narrador afirma apenas que ela deveria se ocupar do dever de evitar, mas não garante que o trabalho de fato eliminaria o problema das enchentes.

TEXTO GERADOR 2

Em “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, Lima Barreto expressa com muita propriedade a preocupação social tão marcante no Pré-Modernismo. Em “Espinhos e flores”, segundo capítulo da segunda parte da obra, estrutura e administração pública do Rio de Janeiro são criticadas. Além disso, são reveladas as desigualdades no cenário do subúrbio carioca.

Espinhos e flores

Os subúrbios do Rio de Janeiro são a mais curiosa coisa em matéria de edificação da cidade.
A topografia do local, caprichosamente montuosa, influiu decerto para tal aspecto, mais influíram, porém, os azares das construções.
Nada mais irregular, mais caprichoso, mais sem plano qualquer, pode ser imaginado. As casas surgiram como se fossem semeadas ao vento e, conforme as casas, as ruas se fizeram. Há algumas delas que começam largas como boulevards e acabam estreitas que nem vielas; dão voltas, circuitos inúteis e parecem fugir ao alinhamento reto com um ódio tenaz e sagrado.
Às vezes se sucedem na mesma direção com uma frequência irritante, outras se afastam, e deixam de permeio um longo intervalo coeso e fechado de casas. Num trecho, há casas amontoadas umas sobre outras numa angústia de espaço desoladora, logo adiante um vasto campo abre ao nosso olhar uma ampla perspectiva.
Marcham assim ao acaso as edificações e conseguintemente o arruamento. Há casas de todos os gostos e construídas de todas as formas.
Vai-se por uma rua a ver um correr de chalets, de porta e janela, parede de frontal, humildes e acanhados, de repente se nos depara uma casa burguesa, dessas de compoteiras na cimalha rendilhada, a se erguer sobre um porão alto com mezaninos gradeados. Passada essa surpresa, olha se acolá e dá-se com uma choupana de pau-a-pique, coberta de zinco ou mesmo palha, em torno da qual formiga uma população; adiante, é uma velha casa de roça, com varanda e colunas de estilo pouco classificável, que parece vexada e quer ocultar-se diante daquela onda de edifícios
disparatados e novos.
Não há nos nossos subúrbios coisa alguma que nos lembre os famosos das grandes cidades europeias, com as suas vilas de ar repousado e satisfeito, as suas estradas e ruas macadamizadas e cuidadas, nem mesmo se encontram aqueles jardins, cuidadinhos, aparadinhos, penteados, porque os nossos, se os há, são em geral pobres, feios e desleixados.
Os cuidados municipais também são variáveis e caprichosos. Às vezes, nas ruas, há passeios, em certas partes e outras não; algumas vias de comunicação são calçadas e outras da mesma importância estão ainda em estado de natureza. Encontra-se aqui um pontilhão bem cuidado sobre o rio seco e passos além temos que atravessar um ribeirão sobre uma pinguela de trilhos mal juntos.
Há pelas ruas damas elegantes, com sedas e brocados, evitando a custo que a lama ou o pó lhes empanem o brilho do vestido; há operários de tamancos; há peralvilhos à última moda; há mulheres de chita; e assim pela tarde, quando essa gente volta do trabalho ou do passeio, a mescla se faz numa mesma rua, num quarteirão, e quase sempre o mais bem posto não é o que entra na melhor casa.
(Lima Barreto)

VERBETE:
Boulevards: Palavra francesa que significa “ruas largas ladeadas de árvores”, avenida.
Vielas: ruas estreitas, becos.
Circuitos: Contornos.
Brocados: tecidos de seda com desenhos em relevo realçados por fios de ouro ou prata.
Peralvilhos: indivíduos com pretensão à elegância.
Chita: tecido de algodão estampado em cores.
Mescla: agrupamento de pessoas.
Quarteirão: quadra; grupo de casas que forma um quadrilátero de que cada um dos
lados dá para uma rua.

ATIVIDADE DE LEITURA
QUESTÃO 4 - Lima Barreto foi um autor marcante na abordagem dos problemas sociais. O texto opõe a condição humilde de muitas pessoas e a afetação dos mais ricos, cercados de pompa, de beleza e do glamour de inspiração europeia. Diante disso, reflita sobre a desigualdade social e responda as seguintes questões:

A. Como é apresentada a paisagem do subúrbio carioca?
B. Identifique no último parágrafo as características relativas aos mais ricos e aos mais pobres e sua relação com o espaço do subúrbio carioca na visão de Lima Barreto.

Habilidade trabalhada: Reconhecer a abordagem de temas universais na produção literária do negro brasileiro.

Resposta comentada

No que tange à alternativa A, o docente pode explicar a irregularidade no tamanho das ruas, a presença das vielas, as casas construídas em sequência, a presença de chalets, casas burguesas, choupanas de pau a pique, cobertas de zinco ou de palha, edifícios altos e novos.
Além disso, faz-se necessário o contraponto entre as ruas europeias e as suburbanas. A rua do subúrbio era tratada com desleixo, distinguindo-se do cuidado e da beleza dos jardins europeus.
Para reforçar isso, seria interessante esclarecer o trecho que menciona os cuidados municipais. Algumas passagens das ruas do subúrbio eram pavimentadas e outras não, chamando a atenção para a desigualdade social no próprio subúrbio.
No que concerne à alternativa B, o docente pode esclarecer a mescla de que trata o autor no último parágrafo. De um lado a elegância das moças com tecidos de seda, do outro, as moças com tecidos de algodão (“de chita”) e o operário que anda de tamancos. É interessante explicar que a existência de seda e brocados são recursos da moda, que podem mostrar as tendências de senhoras que vivem de aparências, imitando o vestir europeu. Finalmente, vale frisar que as diferenças sociais se constituem num tema crucial para a produção pré-modernista. Sem dúvida, trata-se de um tema fortemente ligado à história brasileira e ao contexto carioca, no entanto, não é algo exclusivamente nacional. Na verdade, o capítulo permite revelar que o preconceito social, fundamentado na distinção entre classes, é algo universal e que ocorre em todos os níveis, incluindo o próprio subúrbio.

ATIVIDADE DE USO DA LÍNGUA
QUESTÃO 5

Os marcadores discursivos são elementos linguísticos que fazem referência a partes do texto, podendo englobar o foco no conteúdo da oração ou na intenção de quem fala. Podem ser representados por expressões de modalidade, constituídas por advérbios, conjunções, verbos modais, modos do verbo, marcadores de foco, etc. No cotidiano, podem ser representados por adjuntos adverbiais como “Certamente, estudarei Pré-Modernismo hoje”, em que “certamente” está revelando um programa definido para estudar.
No capítulo “Espinhos e flores”, de Triste fim de Policarpo Quaresma, Lima Barreto apresenta a estrutura do subúrbio em “A topografia do local, caprichosamente montuosa, influi decerto, mais influíram, porém, os azares das construções”, usando os termos “caprichosamente” e “porém”, que podem ser substituídos sem prejuízo de sentido por:

(A) principalmente, também
(B) geralmente, portanto
(C) naturalmente, contudo
(D) calmamente, entretanto

Habilidade trabalhada: Empregar marcadores discursivos (geralmente, muitas vezes...).
Resposta comentada

Ao tratar do assunto, é recomendável distinguir os sentidos entre as opções apresentadas:
Na letra A, o adjunto adverbial “principalmente” mostra algo fundamental, considerado em primeira posição: a geografia montuosa. O autor não destaca a topografia, mas sim o modo como foram construídas as casas, fator determinante para os desnivelamentos na urbanização. O advérbio “também” não está em consonância com a conjunção “porém”, pois enquanto o primeiro acrescenta uma ideia, o segundo opõe ideias.
Na letra B, o adjunto adverbial “geralmente” mostra algo feito regularmente, habitual, de costume. A noção principal da oração em análise não é mostrar algo que está sendo feito em geral, mas de algo que já existe normalmente no cenário do subúrbio. Outra observação é a conjunção “portanto” que dá ideia de conclusão, indo de encontro ao real significado de “porém”: oposição.
Na letra D, o adjunto adverbial “calmamente” pressupõe um estado emocional, que não é posto em relevo na questão. A ideia de tranquilidade, paz, mansidão e outros termos parecidos não são o assunto, nem o foco da questão. Em relação à conjunção “entretanto”, há um consenso de sentido integrado ao significado de “porém”, tendo o mesmo sentido de contraposição.
A resposta certa é a letra C, a expressão “A topografia do local, caprichosamente montuosa, influi decerto, mais influíram, porém, os azares das construções” tem o mesmo sentido de “A topografia do local, naturalmente montuosa, influi decerto, mais influíram, contudo, os azares das construções”, tendo em vista que “naturalmente” expressa o modo como a formação do relevo de montanhas foi feita. Já a conjunção “contudo” expressa contraste assim como “porém”.

TEXTO GERADOR 3
Em suas crônicas, Lima Barreto trata do cotidiano, refletindo acerca de política, sociedade, economia, educação, cultura, costumes sociais e, principalmente, sobre a situação do Rio de Janeiro. Em “As enchentes”, texto escrito em 1915, o autor aborda as enchentes e sua repercussão nas comunicações, nos imóveis e no tráfego urbano. Posteriormente, comenta sobre a engenharia carioca e dá sua opinião sobre como essa questão foi tratada pelo então prefeito Pereira Passos.

As enchentes

                As chuvaradas de verão, quase todos os anos, causam no nosso Rio de Janeiro, inundações desastrosas.
Além da suspensão total do tráfego, com uma prejudicial interrupção das comunicações entre os vários pontos da cidade, essas inundações causam desastres pessoais lamentáveis, muitas perdas de haveres e destruição de imóveis. De há muito que a nossa engenharia municipal se devia ter compenetrado do dever de evitar tais acidentes urbanos. Uma arte tão ousada e quase tão perfeita, como é a engenharia, não deve julgar irresolvível tão simples problema.
                O Rio de Janeiro, da avenida, dos squares, dos freios elétricos, não pode estar à mercê de chuvaradas, mais ou menos violentas, para viver a sua vida integral. Como está acontecendo atualmente, ele é função da chuva. Uma vergonha! Não sei nada de engenharia, mas, pelo que me dizem os entendidos, o problema não é tão difícil de resolver como parece fazerem constar os engenheiros municipais, procrastinando a solução da questão.
                O Prefeito Passos, que tanto se interessou pelo embelezamento da cidade, descurou completamente de solucionar esse defeito do nosso Rio.Cidade cercada de montanhas e entre montanhas, que recebe violentamente grandes precipitações atmosféricas, o seu principal defeito a vencer era esse acidente das inundações. Infelizmente, porém, nos preocupamos muito com os aspectos externos, com as fachadas, e não com o que há de essencial nos problemas da nossa vida urbana, econômica, financeira e social.
(Lima Barreto)

VERBETE:
Tráfego: trânsito.
Squares: praças, áreas (cercadas de ruas), quadras.
Procrastinar: deixar para outro dia, adiar.
Precipitações atmosféricas: expressão relativa à quantidade de chuva caída.
Fachadas: vocábulo relativo à frente do edifício.

ATIVIDADE DE LEITURA
QUESTÃO 6

Nessa crônica, o leitor pode perceber fatos, ou seja, informações incontestáveis relativas a acontecimentos da época, e opiniões, isto é, expressões do ponto de vista do autor. Em qual opção abaixo podemos encontrar um exemplo que contenha apenas a menção a fato, sem explicitação de opinião?

(A) “Uma arte tão ousada e quase tão perfeita, como é a engenharia” (4º parágrafo)
(B) “Que recebe violentamente grandes precipitações atmosféricas” (8º parágrafo)
(C) “Essas inundações causam desastres pessoais lamentáveis” (2º parágrafo)
(D) “O Rio de Janeiro, da avenida, dos squares, dos freios elétricos” (5º parágrafo)

Habilidade trabalhada: Distinguir um fato de opinião relativa a esse fato.

Resposta comentada
A princípio, é importante o professor relembrar a concepção de crônica no que concerne à sua crítica social, à posição defendida pelo autor diante dos fatos sociais ocorridos. Nesse caso, as enchentes são apresentadas como um problema público que a cidade enfrenta há muito tempo e que poderia ser resolvido pelas autoridades, por meio de obras de manutenção das ruas. Essa é a opinião do cronista, que afirma que “De há muito que a nossa engenharia municipal se devia ter compenetrado do dever de evitar tais acidentes urbanos.” Demonstrando ainda o que pensa a respeito do problema das enchentes que o Rio de Janeiro enfrenta, acusa as autoridades de não darem a devida atenção ao assunto, como se pode perceber na afirmação de que “O Prefeito Passos, que tanto se interessou pelo embelezamento da cidade, descurou completamente de solucionar esse defeito do nosso Rio”. A fim de destacar a dimensão do problema enfrentado pela cidade, o autor destaca fatos ocorridos em decorrência das enchentes, como “suspensão total do tráfego”, “interrupção das comunicações entre os vários pontos da cidade”, “desastres pessoais”, “perdas de haveres”, “destruição de imóveis”. Ao mencionar tais fatos, o cronista deixa transparecer sua opinião a respeito deles, como em “prejudicial interrupção das comunicações” e “desastres pessoais lamentáveis”, em que ressalta, através dos adjetivos destacados, sua visão acerca do ocorrido.
Seria interessante, pois, destacar a importância dos adjetivos e advérbios na expressão da opinião sobre o conteúdo proposicional. É importante explicar que o modo como o enunciador se manifesta imprime ao discurso sua intencionalidade. Dessa maneira, ao comentar as alternativas, é interessante solicitar ao aluno que identifique esses termos gramaticais que marcam o ponto de vista. Segue um quadro para orientar essa preparação para a efetiva resposta da questão.

Expressão
Exemplos de palavras de opinião
“Uma arte tão ousada e quase tão perfeita, como é a engenharia” Tão, ousada, perfeita. “que recebe violentamente grandes precipitações atmosféricas” (8º parágrafo) Violentamente, grandes. “Essas inundações causam desastres
pessoais lamentáveis” (2º parágrafo) Lamentáveis. O aluno perceberá, através da identificação dos adjetivos e advérbios, a presença de opinião nas três primeiras opções, embora as opções B e C façam também referência a fatos, como as “precipitações atmosféricas” e as “inundações”. Entretanto, é importante frisar para o aluno que a questão solicita a identificação da opção que faça referência apenas a fato, o que deixa a letra D como única opção possível.
O professor pode explicar o motivo por que a expressão “O Rio de Janeiro, da avenida, dos squares, dos freios elétricos” (5º parágrafo) consiste em um fato. Nesse caso, é interessante ressaltar que se trata de algo incontestável no ano de 1915, considerando as características de urbanização: avenida, squares, freios elétricos, entre outros índices do progresso da época.

TEXTO GERADOR 4

Nesse texto, João do Rio, seguindo a linha que o consagrou como cronista e repórter de sua época, vai à rua para observá-la, analisar seus tipos mais comuns, dedicando especial atenção à fala do malandro carioca. A frase “-E eu, nada”, que se repete ao longo de todo o texto, não representa a fala de um personagem específico em uma situação narrativa determinada. Trata-se, na realidade, de uma expressão de muita versatilidade, utilizada em contextos distintos e com as mais variadas significações, e por isso mesmo admirada pelo narrador.

O dito da “rua”
                Há agora pelas ruas da cidade um novo dito do populacho. Esse dito é ouvido em cada canto e não exprime particularmente coisa alguma. É antes uma das mil faces da irreverência arrogante da canalha. O malandro para, ginga, diz mordaz:
– E eu, nada?
                É a sarjeta impondo-se, é o riso despreocupado do garoto estabelecendo por troça o seu alto lá! invasor de último estado prestes a liquidar os superiores. Nada mais irônico, de chocarrice mais áspera. O cavalheiro conta uma mentira e sente a interrupção corrosiva: – E eu, nada? O cavalheiro leva uma conquista, e por trás ou de cara desnorteia-o a frase: – E eu, nada? O cavalheiro ganha ao jogo, esbraveja, tem sorte, deplora-se, elogia-se. A frase vem como o obstáculo: – E eu, nada? E eu, nada? para todas as coisas pergunta camaleão, último grito da língua verde e do calão!   E eu amo o calão. Propriamente, cada classe social tem o seu calão como as profissões o têm, original e exclusivista. Um idioma é uma floresta extensa com uma infinita variedade de espécies botânicas. (...) Como, porém, há calão e calão, o da canalha é para mim muito mais curioso pela dose admirável de psicologia latente e pela maneira por que se impõe.
                O número, a quantidade, assoberbam fatalmente e obrigam o domínio do calão canalha. Não há memória de uma frase, de um qualificativo de salão que chegue à rua sem perder a significação. A ralé invade tudo com esse turbilhão de qualificativos e de frases que tudo exprimem, e nascem, morrem, brotam em novas frases, incessantemente. Nos ditos que correm as ruas verifica a gente que as cidades ainda são verdadeiras moradas da alegria... (...) “E eu, nada?” é uma frase que pinta um gesto, uma situação, um momento. O reverso desta formidável época de avanço não pode ser outro senão a indagação de alto lá! irônica e debochativa: “E eu, nada?” (...) A frase pode ser a divisão de metade maior, como dizem as crianças, quando pedem a repartição de um bolo, porque a humanidade sempre se dividiu numa parte que come, e na outra que espera a vez. A que espera a vez está mesmo a dizer o “– E eu, nada?” Frases tais valem por poemas e por tratados de sociologia. Quem a fez? ninguém sabe. Nascem do anônimo, o anônimo fá-la saltar ao ar de toda a parte, por todos os cantos, e agora, no Rio, cidade de ambições desvairadas, de riso, de troça, de luxúria, para todas as coisas, só há uma frase: “– E eu, nada?” pergunta camaleão, último grito dos sem vintém, da língua verde e do calão! (João do Rio)
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VERBETE
Canalha: pessoa traiçoeira, má.
Sarjeta: lugar, situação ruim.
Chocarrice: gracejo atrevido e grosseiro.
Corrosiva: aquilo que corrói, destrói.
Esbravejar: berrar, gritar.
Deplorar: lamentar, lastimar.
Calão: linguagem especial, peculiar.
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ATIVIDADE DE LEITURA
QUESTÃO 7

O texto literário reflete o contexto sociocultural de sua época. No caso do Pré-modernismo, a valorização do popular foi uma prática inédita até então e tem em João do Rio seu grande representante. Sendo assim, suas crônicas possuem um caráter mais jornalístico, ou seja, em “O dito da rua”, o narrador não está contando uma história, com início, meio e fim; ele está fazendo comentários sobre um fato. Baseando-se nesse texto, responda às questões abaixo.

a) Identifique os seguintes elementos:
_ Fato:
_ Quando o fato ocorre:
_ Onde o fato ocorre:
_ Quem está envolvido no fato:

b) Como o narrador se posiciona diante deste fato: de forma positiva ou negativa? Justifique sua resposta transcrevendo uma passagem do texto.

Habilidade trabalhada: Relacionar os modos de organização da linguagem às escolhas do autor, à tradição literária e ao contexto sociocultural de cada época.

Resposta comentada
a) O fato é o surgimento de uma nova expressão popular, especificamente da malandragem carioca, o “-E eu, nada?”. O cronista, localizado na cidade do Rio de Janeiro no início do século XX, vai às ruas conhecer as classes mais populares da cidade, representadas nesse caso, pela figura do malandro carioca.
b) O narrador posiciona-se de uma forma até então inovadora, pois seu intuito, ao se dedicar a essa camada da população, não é o de formar um retrato caricatural ou sugerir correções morais. Ele apenas quer conhecê-la e exaltá-la em sua singularidade, apresentando, então, uma avaliação positiva sobre o fato narrado. Um trecho significativo seria: “E eu amo o calão. Propriamente, cada classe social tem o seu calão como as profissões o têm, original e exclusivista. Um idioma é uma floresta extensa com uma infinita variedade de espécies botânicas. (...)”.
A fim de explorar ainda mais a crônica, o professor também pode ressaltar para os alunos os seguintes aspectos:
Personagem e Conteúdo: As crônicas não apresentam personagens de psicologia complexa, que necessitem de um desenvolvimento típico de um conto ou romance, por exemplo. Sendo assim, o cronista busca retratar em seus textos as pessoas comuns, em situações corriqueiras. No caso da crônica de João do Rio, em função de seu contexto de produção, um dos objetivos era conhecer o Brasil e, por isso, o cronista vai às ruas para observar o comportamento desse novo grupo social, o malandro. Para tratar desse grupo, ele escolhe um dos aspectos – a linguagem – e tece as suas considerações a respeito do modo de falar desse segmento da sociedade.
Linguagem e narrador: Narrado em 1º pessoa, “O dito da rua” centra-se na análise da linguagem do malandro carioca. De forma bastante objetiva e clara, o narrador tece comentários a respeito dos variados usos para a frase “E eu, nada?”. Além disso, percebe-se nitidamente que o tom do texto é de conversa, sem formalidades. O narrador de João do Rio, em 1º pessoa, cumpre o papel de um repórter que vai às ruas conhecer a realidade.
Tempo: O “agora” do texto não apresenta significação própria, somente o contexto confere a ele um valor semântico, de modo que, ao lerem essa frase, os alunos devem perceber a necessidade de se transportarem para o início do século XX. Do contrário, a compreensão do texto ficará comprometida.
Espaço: Durante o Pré-Modernismo, foi comum que a literatura se voltasse para várias partes do Brasil, tentando conhecê-lo melhor. Coube, então, a João Paulo Emílio Cristóvão dos Santos Coelho Barreto, o João do Rio, dedicar-se ao Rio de Janeiro das classes populares, das ruas, da noite, dentre outros aspectos trabalhados em sua obra. Nessa crônica em especial, há várias vezes uma referência explícita ao Rio de Janeiro. Vale destacar que nas crônicas o espaço é limitado em função de não haver um desenrolar complexo de ações.

ATIVIDADE DE PRODUÇÃO TEXTUAL
QUESTÃO 8

Os textos lidos neste roteiro são exemplares do Pré-Modernismo brasileiro. Considerando que outras produções também se destacaram, desenvolva uma pesquisa sobre autores e obras desse período. Com as informações levantadas, elabore um painel, contemplando os seguintes tópicos:

a) Autores em destaque;
b) Obras mais relevantes de cada autor no período pré-modernista;
c) Breve resumo das obras;
d) Trabalhos artísticos e produtos culturais inspirados por essas obras;
e) Aspectos socioculturais brasileiros presentes nas obras;
f) Relevância e/ou atualidade das obras.

Habilidade trabalhada: Pesquisar sobre autores e obras do período pré-modernista e preparar um seminário/debate regrado para apresentação, utilizando recursos midiáticos e infográficos, citação de fontes e tempo para questionamentos do público.

Comentário:

Nesta questão, importa que os alunos desenvolvam uma pesquisa sobre a produção pré-modernista.
Eles podem produzir cartazes, escrever em blogs ou, simplesmente, reunir essas informações num trabalho escrito a ser entregue ao professor. Nessa atividade, o formato ou o gênero não é o mais relevante. Como o próprio descritor deixa claro, a produção deste momento terá sua culminância apenas no próximo ciclo, quando serão abordados os gêneros seminário e debate regrado.

Uma possibilidade de organização do trabalho é dividir a turma em grupos e definir um formato de apresentação. Os aspectos listados no enunciado servem para orientar a produção dos alunos e facilitar a reflexão sobre os principais traços observados nas obras do período.